quinta-feira, 20 de março de 2008

há um lago nos olhos da casa

há um lago nos olhos da casa
fechado
em teu coração

o enfraquecido
pulsar do sangue
não logra abri-lo

na água nem uma vibração

sexta-feira, 7 de março de 2008

NO DIA MUNDIAL DA MULHER - sobre histórias de vida de mulheres

Posted by Picasa

Enchia a boca para dizer como gostava dela. Como a amava.
A todos indiscriminadamente. Mesmo a quem nunca a vira, muito menos a conhecia e nunca poderia reconhecê-la.
Marejavam-se-lhe os olhos e deixava as águas correr mansas como convêm a homem de boa criação.
Dizia da dor que sentia pela ausência. Da ingratidão talvez…,de tudo o que lhe dera e da incompreensão e dureza dela.
Quem o ouvia concordava ao vê-lo tão esfacelado, tão dorido… O sofrimento assim exposto.

O que nunca dissera a ninguém, talvez nem a si mesmo, era de como ela o amara com carinho, de como a remetera para um segundo ou terceiro plano, a colocara num insustentável lugar e estatuto que ela, estóica e dedicada, suportara, na esperança de que ele visse o erro nos seus comportamentos e atitudes, pois lhe ia dando algumas dicas sobre o desconforto que por vezes sentia mais forte e só ultrapassava apelando a toda a sua energia e amor.
O que ele nunca disse a ninguém foi de como as necessidades dela lhe eram de pouca importância porque afinal estando ele presente – aparentemente diria ela – ela tinha o mundo. Claro que nunca poderia dizer isto porque sobre tal comportamento não reflectia.
Seria atávico, genético, adquirido na primeira infância e fossilizado…?
Pouco importava pois o resultado era só um e sempre o mesmo.
Vivia a vida em função de si mesmo e esperava, mais, exigia que ela assim vivesse e todos os gritos dela, uns de socorro, outros de alerta, passavam-lhe ao lado. Fantasmas incorpóreos sem peso e sem sentido, nunca vistos nem ouvidos.

Ela, como vinha, lançava apelos como âncoras, raízes que se espalhavam no ar, gavinhas… Mas fugidia era a natureza dele a tudo o que não fosse o seu universo. Um mundo e uma vida nos moldes por ele definidos.
Etéreo ou imaterial era o seu sentir. Nunca se deixava tocar.
Nunca se deixou tocar. Só os gestos que lhe eram destinados o alcançavam e importavam.